quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Logoff


Quando criança, corria descalço pelo bairro jogando bétia na rua, acho que esse foi o mais perto que cheguei de ser atleta. Até hoje carrego a marca nos pés de um dia em que “dei uma bicuda” na redonda, ou quase, a redonda rolou, e arrebentei os dedos na calçada. Bom, nesse dia aprendi a só sair de casa devidamente calçado.

Adolescente com os hormônios em fúria, apaixonei-me pelo rock, gravava em fita cassete as lindas canções de RAMONES, PANTERA, RAIMUNDOS, e tantos outros. Soava como libertação, ali, no rock, aprendi sobre política, música, vida, sexo, drogas, como fugir de uma briga, como entrar em uma briga. O rock, assim como a bétia, me rendeu lições, aprendi música, aprendi respeito, e principalmente, aprendi que ressaca não tem cura.


Já adulto, quando as portas do mundo se abrem, todas essas pequenas situações são maximizadas. A estupidez de uma criança pode até ser engraçada, já a de um adulto.... Acidentes automobilísticos são bem diferentes de chutar calçada, mas são tão eficientes quanto na hora da lição (ao menos para alguns). Tequilas e volante definitivamente não combinam.


Cerveja e brigadeiro são deliciosos, mas seu estômago já não é tão durão quanto antes, misture-os e você certamente terá um baita d’um “dilurimento nas tripa”, como diria Vó Zabé. Todas as encrencas e aventuras que me meti me ajudaram de alguma forma, seja pra ensinar a me dar bem na vida ou a foder menos com ela.

Vi de perto a evolução das redes sociais e interatividade online. E vejo diariamente a “falta de vida” que nos cerca. Futebol virou Pro Evolution Soccer (ou FIFA, depende do gosto). O papo da pracinha virou chat, a balada se transformou em comunidade no Orkut. Pergunte a uma criança o que é um rolimã, ela vai rir e dizer que não precisa, pois já lançaram o novo Need For Speed pro PS3. Se alguém te incomoda, você não contesta, clica com o direito e seleciona bloquear contato.

Eis o paradoxo, um professor de informática criticando a evolução tecnológica. Aí está o detalhe, sou plenamente a favor da tecnologia e todas as facilidades que ela nos proporciona. Só não acho correto abdicar de uma vida para usufruir de um mundo virtual.

A cada dia fica mais notável a falta de capacidade de comunicação dos mais jovens. Eles teclam muito bem (não disse que escrevem corretamente, só digitam bem), fazem downloads, publicam suas fotos nas comunidades virtuais. Mas coloque dois deles lado a lado. Fica nítida a dificuldade de se relacionar com o mundo. Eles falam errado, comem errado, se sentam errado. Ou será que fui eu quem aprendeu errado? Que me enganei ao pensar que ir a casa de um amigo lhe dar um abraço é mais importante que enviar um depoimento no Orkut. Que uma boa conversa é mais esclarecedora do que qualquer fórum. Que jogar bétia na rua é mais legal que damas on line.

Que me desculpem os “tuiteiros”, mas sou muito mais que 144 caracteres.


Leandro Faustino



* Texto postado em Setembro de 2010 na Rádio Canalha!

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